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Procuração em causa própria e sua vantagem na compra e venda de imóveis

*Por Samira de Mendonça Tanus Madeira

Inicialmente, convém explicar que procuração é uma espécie de mandado, que é um contrato por meio do qual o mandatário recebe poderes para praticar atos e administrar interesses em nome e por conta do mandatário. Por isso, o mandante é quem fica obrigado pelo ato do mandatário. Ou seja, a procuração é o poder que uma pessoa dá a outra de agir em seu nome.

Seu principal meio de utilização é para casos em que há uma transação de compra e venda de imóvel, que, no momento, não pode ser registrado. Sendo este procedimento de registro da escritura o meio jurídico efetivo para transferência do bem, e não querendo o comprador depender da assinatura futura do vendedor, na ocasião da elaboração da escritura de compra e venda poderá ser feita uma procuração em causa própria, para que, no futuro, o próprio comprador assine o referido documento também em nome do vendedor.

O Código Civil, em seu artigo 685, estabelece que conferido o mandato com a cláusula “em causa própria”, a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objetos do mandato, obedecidas as formalidades legais.

Dentre as características, pode-se citar que este tipo de procuração é irrevogável e irretratável e elaborada quando ocorre a quitação do preço do imóvel e a parte mandante não pode estar presente para celebrar a Escritura de Compra e Venda.

Conforme afirmado pelo professor Carlos Eduardo Elias de Oliveira, a procuração ou mandado em causa própria, ao contrário do que se dá com o mandato em geral, é outorgado no interesse exclusivo do mandatário (e não do mandante). É que o mandato em causa própria autoriza o mandatário a representar, no próprio interesse, o mandante. Como o mandatário não agirá no interesse do mandante, o mandato em causa própria, além de ser irrevogável, não se extingue com a morte e não gera dever de prestar constas.

Outro meio de utilização é aquele em que o comprador, visando obter uma economia tributária, realiza a transação de compra e venda por meio da procuração em causa própria. Em termos práticos, por exemplo, se eu quero comprar um imóvel a preço inferior ao praticado no mercado, com a intenção de obter um lucro com a sua revenda a um terceiro por um preço maior. Assim, esse arranjo negocial envolveria duas transmissões onerosas, uma do proprietário para mim, e a outra para a segunda venda, realizada para um terceiro, havendo duas incidências do imposto de transmissões onerosas do imóvel (ITBI).

Neste ponto, importante ressaltar que no final do ano passado, o STJ, no AREsp 1.760.009, reafirmou o entendimento adotado pela corte após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 1.124 da repercussão geral. Segundo esse entendimento, o fato gerador do ITBI somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro no cartório de imóveis. É dizer, havendo procuração em causa própria eu não efetuaria a transferência e registro para o meu nome antes de realizar a venda para o terceiro, pois, primeiro, estaria protegido de qualquer má-fé do vendedor e, segundo, sabendo que a transferência efetiva do imóvel necessita do registro no cartório competente, haveria, desta forma, apenas uma transação capaz de gerar o fato gerador do tributo, qual seja, a minha venda para terceiro.

Desta maneira, entende-se que não há fraude fiscal, já que a procuração “em causa própria”, além de ser prevista em lei (no art. 685 do CC), não ensejou o fato gerador do ITBI, já que o procurador jamais se tornou titular do direito real de propriedade e, portanto, nunca desfrutou dos privilégios desse tipo de direito (como a oponibilidade erga omnes), por não ter realizado o registro da transação no cartório competente.

Assim, conclui-se que é descabida a cobrança do ITBI para essa hipótese, por força do recente entendimento do STJ e STF sobre o fato gerador do imposto ITBI.

*Samira de Mendonça Tanus Madeira é advogada (OAB/ RJ 174.354), com especialização em Direito Processual Civil, Planejamento Sucessório e Direito Imobiliário. Extensão em Contract Law; From Trust to Promisse to Contract – Harvard University e Direitos Humanos e Novas Tecnologias pela Universidade de Coimbra. Sócia do escritório Tanus Madeira Advogados Associados, fundado em 1983, com unidades nas cidades do Rio de Janeiro e Macaé- RJ