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A RECENTE DECISÃO DO STF E OS RISCOS DO CONTRATO DE LOCAÇÃO COMERCIAL GARANTIDO POR MEIO DA FIANÇA.

*Por Samira de Mendonça Tanus Madeira

Muito se sabe sobre os casos de não cumprimento de uma obrigação contratual, causados pela falta de pagamento do aluguel por parte do devedor. Na busca de uma maior segurança jurídica, buscando amenizar os prejuízos do não pagamento dos alugueis, os contratos de locações possuem alguns mecanismos próprios, chamados de garantias locatícias. Dentre elas, as mais comuns são: fiança, seguro e depósito.

O instituto que será tratado no presente artigo é a fiança e, consequentemente, a possibilidade ou não da penhora do bem de família dado em garantia para satisfação do crédito.

Muito se escuta sobre o caso da famosa impenhorabilidade dos bens de família, que pode ser conceituado como o imóvel utilizado como residência da entidade familiar protegido por previsão legal específica.Portanto, os bens de família seriam aqueles integrantes da residência familiar, incluindo móveis e imóveis.

Ressalta-se, ainda, que o conceito de impenhorabilidade do bem de família aqui trabalhado abrange, também, o imóvel de pessoas solteiras, divorciadas e viúvas, conforme a Súmula 364 do STJ. Ou seja, o bem de família independe da quantidade de indivíduos.

Falaremos neste artigo sobre uma das exceções à impenhorabilidade do bem de família, que é aquela decorrente do contrato de locação, quando o fiador oferece como garantia seu único imóvel considerado bem de família.

A exceção possui objetivo de fomentar  a moradia e o livre mercado de locações de imóveis no espaço da autonomia privada, para que o particular possa manifestar sua vontade livre de que, caso o locatário não venha a honrar as obrigações contratuais, os seus bens possam responder subsidiariamente pela dívida da locação, inclusive o bem de família. É que a fiança é a única garantia contratual que não onera o contrato de locação.

Sobre esse fato, houve diversos questionamentos, especialmente da alegação de que violaria os preceitos constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito à moradia.

O plenário do STF, no julgamento do RE 407.68S8, decidiu ser legítima a penhora de bem de família pertencente ao fiador de contrato de locação, reconhecendo a compatibilidade da exceção com o direito à moradia e à dignidade da pessoa humana. Em seguida, tal orientação foi alçada como precedente jurisprudencial no Tema 295 perante o STF e na Súmula 549 do STJ (“É válida a penhora de bem de família pertencente ao fiador de contrato de locação”).

Porém, em sentido contrário, um recente julgamento  da  1ª Turma do STF, no RE 605709/SP,  adotou o entendimento de que a dignidade da pessoa humana e a proteção à família impedem a penhora do bem de família do fiador em locação comercial, sob pena de privilegiar a satisfação do crédito do locador do imóvel comercial ou o livre mercado.

Novamente, em julho do presente ano, o STF, através do julgamento do RE 1.278.427 SP, entendeu no mesmo sentido, afirmando que a exceção da penhorabilidade do bem de família de fiador em contrato de locação não se aplica aos contratos de imóvel comercial.

Estas decisões representam uma grave insegurança jurídica. Primeiro, porque diversos contratos locatícios foram realizados utilizando como garantia a fiança e pautados na possibilidade de penhorabilidade do bem de família. Segundo, porque a redação conferida pela lei permite a penhora de imóvel residencial do fiador no caso de execução de crédito locatício, não fazendo distinção quanto à finalidade, se residencial ou comercial.

Conclui-se, ainda, que os princípios constitucionais da livre iniciativa e da autonomia privada não podem ser dissociados pelo simples fato de a locação ser comercial, na medida em que conferem liberdade ao particular de decidir onde e como serão aplicados os seus bens, sendo certo que a exceção da penhorabilidade do bem de família do fiador fomenta a liberdade econômica.

*Samira de Mendonça Tanus Madeira é advogada (OAB/ RJ 174.354), com especialização em Direito Processual Civil e Direito Imobiliário.  Sócia do escritório Tanus Madeira Advogados associados, fundado em 1983, com unidades nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Macaé- RJ.